Ficar, Rolar e Namorar

Eu vou tentar passar para vocês alguma coisa do que aprendi trabalhando durante quase 20 anos com adolescentes, com gente da idade de vocês, que vai dos onze aos 15 anos. O que eu posso dizer a vocês é que o seguinte: que sexo é saúde, para começar, faz parte da nossa saúde mental e física o exercício da sexualidade, mas essa sexualidade é vivida dentro de um contexto, uma situação familiar, uma situação religiosa, uma situação política do nosso Brasil.

O Brasil é um país quente, cheio de praias, o esporte é o futebol, a dança é o samba. Isso significa que o nosso povo é um povo alegre que descendente de três ramificações, nós somos filhos de negros, de índios e de brancos, de uma forma bem mista, nós somos mestiços por natureza.

Se nós somos mestiços, nossa alma é muito ampla, é um povo diferente do mundo inteiro. Eu viajo muito e tenho convivido com pessoas de várias partes do mundo, e posso dizer que brasileiro é um povo extremamente interessante em relação a essa força, à esperança que tem pelas coisas.

Ou seja, o brasileiro é um povo muito sexualizado. O que significa isso: essa energia que vocês têm aí, que direcionada para várias coisas. Vocês podem usar a energia para jogar bola, para dançar no bailinho, pintar um quadro, tocar vilão, pensar numa poesia, escrever uma redação na escola, ou seja, essa energia pode ser canalizada para qualquer coisa.

Enquanto vocês são pequenininhos, entre dois e 10 anos de idade, essa energia já existe. Só que ela é direcionada para várias coisas fazem, brincadeiras, jogos, etc. Aí chega lá pelos 10 anos de idade, vai entrar na circulação, ou seja, no sangue de vocês, uma substância, que é fabricada por uma parte do corpo de vocês, no testículo do homem e no ovário da mulher, uma substância chamada hormônio. Acontece uma revolução no corpo de vocês, que muda completamente o corpo.

Como hoje a gente vive uma época em que os meninos vêem televisão, as meninas vêem televisão, vocês têm os ídolos de vocês, que são sei lá, um jogador de futebol, um ator, um cantor, uma atriz, uma cantora, então todo mundo aí tem uma pessoa que acha um homem bonito, um homem interessante, um cara que você admira uma mulher também interessante, bonita, que vocês admiram.

Muito bem. De um modo geral, como as crianças vêem muito a televisão, as meninas querem muito alguma coisa assim: a cara da Angélica, o corpo da Xuxa, o bumbum da mulher do tchan, a perna de fulana de tal; os meninos querem ter, sei lá, o corpo do Schwarzenegger, a força do anormal do Palmeiras, aquela coisa do jogador de futebol, então cada um tem um ídolo, um corpo que acha interessante. E o corpo começa a mudar.

Quando o corpo começa a mudar, vocês começam a se frustrar, porque queriam ter o peito de fulana, mas o peito está para baixo e para cima, não está igual. O outro quer ter o bíceps do ator, mas o braço está fininho e não tem. Então, vejam bem. Na verdade, esse comecinho aflige todos vocês. Quer dizer, a gente nunca tem o corpo que quer ter. Porque a gente tem educação, uma infância na qual, aos meninos, por exemplo, se fala assim: “Meu filho, tire dez em Matemática, tire dez em história, faça o gol no futebol, faça cesta no basquete, senão eu não vou gostar de você”. E às meninas: “minha filha, fique aí, sente bonitinha, cabelo cortadinho, não masque chiclete, arrume-se direitinho, faça tudo certinho que eu vou te amar”.

Então assim, as mulheres começam a associar amor-próprio com imagem e beleza estética. E nós meninos começamos a colocar nosso amor-próprio num gol que a gente faz, na nota dez de boletim, ou seja, no desempenho que a gente tem. Então como é que fica a coisa? Fica assim: a mulher passa a vida dela todinha colocando tudo na imagem dela. E o menino fica colocando tudo, o amor dele próprio, no que ele faz.

Aí começa a complicar, vocês começam a namorar. Começam a ficar. Começam a rolar.

O que é rolar? O rolar simplesmente é quando os hormônios entram na circulação de vocês, no corpo de vocês, eles fazem uma revolução. O corpo está mudando. Vocês começam a interessar-se pelo sexo oposto, também pode haver pelo mesmo sexo, faz parte, está certo então o homossexualismo nessa idade não é uma doença, uma complicação, é uma fase, ás vezes as meninas, ás vezes outros rapazes mais velhos, faz parte do nosso desenvolvimento.

Aí o que acontece? Toda essa energia que está dentro de vocês, assim espalhada? É assim, por exemplo. O menininho, pequenininho, já ouviu falar em exibicionismo, esse palavrão, já ouviu falar em sadismo, em masoquismo, todas essas coisas assim? O menininho pequeno pode sair por aí peladinho para exibir o pintinho dele, se ele quiser. A menininha pode exibir a bundinha dela, se ela quiser, porque como crianças, nós podemos ser sádicos, morder alguém, podemos ser masoquistas, podemos ser todas essas coisas.

Mas depois de dez, onze anos, começa a mudar. Então já começa a estudar o seu corpo, tem vergonha tomar banho perto das pessoas, se esconde um pouquinho mais, normal, faz parte, Muito bem. Tudo que era muito assim no corpo todo, passa a acumular aqui genital. Você passa a ficar com a sensação mais forte no genital. Isso é natural.

Qual seria então o processo mais adequado, mais saudável e mais comum no desenvolvimento do seu corpo? É o seguinte, gente. Quando você começa a ter sensações “aqui” é o mesmo tempo que você começa a ter sensações “aqui ó”, na cabeça. Então começa a aparecer o interesse, o interesse sexual, quer dizer, o que é isso que está mexendo comigo? Por que é que eu vejo aquele menininho ali e balanço a perna?

Eu vejo aquela menininha e fico meio diferente, sentindo meio quente?
O que é isso aqui? Tesão puro! Isso se chama, é uma situação de excitação que pode aparecer, e vai aparecer como excitação para vocês.

Muito bom! Aí está em casa tomando o seu banho, vir na cabeça a Kim Basinger, a loirinha. O que acontece? Vocês começaram a tocar no corpo de vocês, certo, e a sentir sensações diferentes. Esse tipo de procedimento, ele é extremamente saudável para você começar as sensações do seu corpo. O nosso corpo tem um mapa sensorial. São áreas onde você tem sensações. Se você, quando era pequenininha, a sua mãe lhe fazia uma massagem “aqui ó”, nas costas essa área quando for tocada mais tarde pelo seu namorado, você vai relaxar, vai sentir uma sensação boa aqui.

Agora, se sua mãe lhe dava um beliscão “aqui ó”, essa área do corpo está fechada, tipo assim, encostou ali dá aversão, dá cócegas, dá uma sensação de mal-estar. Então o nosso corpo, ele tem um grande mapa sensorial, está certo? Agora, quem é que vai descobrir esse mapa, quem é que vai descobrir qual o lugar em que eu gosto mais de ser tocado, sou eu mesmo? Exatamente eu mesmo.

Quando eu tenho meus 12, 13, 14 anos começo a pensar em mim mesmo, começo a me tocar, eu estou descobrindo o meu mapa sensorial, quer dizer, onde eu tenho sensações. Aí inicia o processo de masturbação? É o processo aonde você vai se tocar e sentir uma sensação gostosa.

Isso é mais comum, infelizmente, nos homens. Isso porque nós homens estamos toda hora com a mão no pênis, fazendo xixi, escrevendo no chão com xixi, fazendo xixi longe, nas pessoas, então para nós é muito fácil. Agora, as mulheres, não. Elas têm que sentar para fazer xixi, o genital é lá para dentro. Elas não conseguem ver o seio, o resto não aparece, então nós homens que começamos a apertar o pênis para ver se sai um liquidozinho, que é o sêmen, fica mais fácil para nós homens aprendermos a nos masturbar.

Para a mulher é mais difícil. Porque a própria educação fala assim: “ó minha filha, não toca aí que pode sujar, não põe a mão aí pode dar um corrimento pode dar uma infecção”. Então a mulher tem uma história diferente da nossa. Olha, eu posso garantir para vocês uma coisa, médico atendendo isso aí há 22 anos. Eu tenho 46 anos de idade. Veja bem, então são vinte e dois anos de formado, atendendo pessoas na idade de vocês, e outras idades também.

O que é que aprendi com vocês todos? Aprendi o seguinte: que a base da saúde sexual das pessoas está na infância. Ou seja: na infância, ser bem cuidado, com amor, pelas pessoas que estão na casa de vocês, que as mensagens que passam para vocês não sejam assim: “Eu amo o que faz – aquele gol no futebol – ou a tua imagem de menininha certinha”, mas “eu amo você, não importa o que você seja como imagem, ou o que você faça. As coisas boas têm que ser reforçadas, é óbvio, as coisas ruins têm que ser de alguma forma limitada. Mas nós podemos ter a mensagem que a gente só vale por aquilo que faz ou pelo que tem de imagem.

Segundo ponto: o corpo da gente só se torna corpo num outro corpo. Ó que interessante!

Não adianta eu falar pra você: “eu amo você, você é uma gracinha, minha filha”. Eu tenho que tocar em você, acariciar você, beijar você e abraçar você. Ou seja, o corpo só desenvolve com outro corpo. Sensorialmente falando.

Na adolescência, o processo de autoconhecimento. Por quê? Porque amanhã vocês já estão, não sei, transando com algum namorado ou namorada, e vão perceber o seguinte: é enorme o numero de problemas sexuais. Enquanto está ficando, que está ali numa festa, troca um beijinho, um amassinho, coisa e tal, perfeito, nenhum problema. Enquanto está rolando alguma coisa também, alguma coisa mais duradoura, também tudo bem. Mas começa a namorar, envolve a coisa do que? Eu gosto dela, então quero que ela seja feliz, que fique bem, então vou tentar fazer coisa pra ela legal. Aí passa coisa aquela assim, de que homem é o responsável pelo prazer da mulher. Não é?

E o contrário, e a mulher sentindo também que se alguém tiver que consiga fazê-la ter um orgasmo, ela vai ter. Ponto básico. Masturbação é um aprendizado senso-motor da fantasia, da cabeça e do genital, que todo mundo deve aprender naturalmente a exercitar. Não dizer assim: “o Malcolm mandou agente se masturbar”. Não é que eu estou falando. Digo o seguinte: “naturalmente que as pessoas aceitem isso como um aprendizado de seu corpo”.

Então vejam. Nós vivemos em uma cultura católica. A cultura católica diz que só pode ter relações depois do casamento depois de casar, não é? Essa não é a realidade da gente.
A realidade é que todo mundo aqui tem vontade de ficar junto com todo mundo, quando tem, afeto, quando tem amor, quando tem interesse, de uma relação que posa progredir para o namoro, que possa progredir para um casamento. Vocês têm ideia de quantas gestações são programadas no Brasil? Tipo assim: gravidez planejada? O que uma gravidez planejada? Um casal maduro, que se dá bem, amorosamente, está a fim de ter um filho e engravida. Quer dizer: esse é o cenário. Sabe quantas acontecem nesse cenário ideal de uma gravidez? Para vocês terem uma ideia, não chegam a 2%, ou seja, 98% acontecem. Por que acontece? Porque sexo não é dominável.

Eu posso vir aqui e fazer o seguinte: “moçada, vamos usar a pílula, vamos usar camisinha”; vocês podem saber que tem a pílula, saber que tem a camisinha, e amanhã vocês podem a sair noite, ficar com alguém, transar com alguém, engravidar. Mesmo sabendo que tem a pílula, que tem a camisinha, que tem o coito interrompido. A informação é importante. Mas o que é mais importante é agente cuidar-se, alimentar-se bem, fazer um esporte, fazer uma atividade física, evitar coisas que nos possam prejudicar, evitar cigarro, bebidas em excesso, dormir razoavelmente bem, quer dizer, dormir direitinho, ter uma coisa mais equilibrada, usar o cinto de segurança quando sai de carro para evitar um acidente, quer dizer, cuidar-se.

Agora, você só se cuida quando se gosta. Se não, você vai agir destrutivamente mesmo, não é? Então, se eu quero me destruir, eu saio a 120 por hora numa avenida, aí me arrebento ali e morro ali mesmo. Então assim: o sexo, se ele for proibido para vocês, se for uma coisa proibida, eu garanto que vocês vão exercitar o sexo de maneira destrutiva.